
LETRAS
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BARCO PARADO NÃO FAZ VIAGEM
Carlos Alberto Moniz (2021)
Samacaio é um navio
Que foi feito na Terceira
Navegou e aportou
Numa praia brasileira
Duma praia brasileira
Samacaio fez-se ao mar
No meio de tempestades
Noite e dia a navegar
Sem uma pinga de vento
Numa noite de luar
Veio a bordo uma sereia
Nunca mais voltou pr’ao mar
REFRÃO
Barco parado
Barco parado
Barco parado
Não faz viagem
Já cantei o Samacaio
Em mais de vinte países
Em todos deixei plantadas
Árvores de fortes raízes
O veleiro Samacaio
Fez aguada nos Açores
Trazendo Camões a bordo
Para a Ilha dos Amores
Madeira, Açores, Cabo Verde
De mãos dadas a cantar
São os traços de união
Deste triângulo do mar
REFRÃO
Quem canta o Samacaio
Sabe dar um "pé de dança"
Enquanto espera uma alcatra
P’ra poder encher a pança
Nos porões do Samacaio
O Verdelho abundava
À noite pela calada
Era ver quem mais emborcava
Samacaio continua
Navegando mundo inteiro
Foi agora transformado
Em navio de cruzeiro
REFRÃO
4. NEMÉSIO, MEU AMIGO
Carlos Alberto Moniz/Norberto Ávila
Mestre Vitorino Nemésio,
doutorado em Poesia.
Raízes no mar ilhéu
e no vento a voz sentida.
De quando em quando recebe
notícia da ilha ausente,
que, de saudade ferida,
sua ausência não consente.
REFRÃO
Senta-se ao lado do povo,
a quem chama seu amigo.
Do Brasil o estão chamando:
Parte, seu hábito antigo.
Servidor da Poesia,
servidor de quem o serve,
prolonga o canto da vida,
enquanto a vida se escreve.
O seu cavalo o espera,
brilhando na noite escura,
ruminando palha fina,
com algum verso à mistura.
Espera-o a viola certa,
para o concerto do dia,
com as mãos de quem inventa
claros sinais de alegria.
REFRÃO
E com seu ar descuidado
de quem deixa a porta aberta,
abre o silêncio – e a palavra,
a sua melhor oferta.
REFRÃO
7. NAUFRÁGIO
Polular açoriana/Cristóvão de Aguiar
A história que eu vou contar
ouvi-a na minha aldeia
onde à noite a voz do mar
murmura canções na areia.
Uma história de pescadores
do cais negro da Pontinha
onde há grandes senhores
que bocejam à noitinha.
Foi o barco do Zé Tordo
partiu na noite para o mar
e na madrugada ao porto
o seu barco sem chegar.
Encheu-se a praia de gritos
de gente da minha aldeia
ao ver o corpo do Zé
trazido na maré cheia.
Ouvem-se vozes, coitado
cinco filhos e mulher
sem uma côdea de pão
sem um abrigo sequer.
E no enterro à viúva,
levando ao Zé muitas flores,
prometem-lhe a sua ajuda
o povo e os grandes senhores.
Mas dois anos já são passados
e na praia da minha aldeia
vêem-se cinco crianças
brincando nuas na areia.
E da moral desta história
tirem vossas conclusões
uma família não vive
só de boas intenções.
10. ANGRA, 50 ANOS DEPOIS...
Carlos Alberto Moniz/Álamo Oliveira
Há cinquenta anos
que te chamo de princesa!
Há cinquenta anos
que te canto como louco,
Minha cidade,
património de beleza!
Por mais que te cante,
é sempre pouco!
Essa nobreza,
que te veste de cultura,
Já vai na marcha
com bonitas bailarinas.
A tua história
é este povo de ternura,
Que sempre canta
Sanjoaninas!
REFRÃO
Angra, que eu louvo
Em versos de lua,
E que o nosso povo
Vem cantar na rua.
Já me falta o jeito
De te dar a mão
Salta p’ró meu peito!
Vem com São João.
Desce a Memória,
vai até à sua Praça
Que, mesmo Velha,
vai Direita até ao mar.
Esta Cidade
é o tempo que não passa;
É um namoro
por namorar.
A marcha desce,
num bailado de alegria,
Rua da Sé
bem destinada a São João.
Como são lindas
as varandas da poesia
Onde debruças
o coração!
REFRÃO
13. BOI DO MAR
Luís Alberto Bettencourt/Victor Rui Dores
Vogando em botes ligeiros
nas voltas do mar deserto
navegaram baleeiros
em busca de um rumo incerto.
Fica terra a barlavento
a baleia já avança
mar nos olhos, proa ao vento
vamos arpoar a esperança
REFRÃO
Baleeiros, baleeiros,
a memória ainda perdura
sois os heróis derradeiros
da marítima aventura.
A baleia é boi do mar
que tombou na agonia
rema, rema, é só remar
já findou o negro dia.
Quem plantou sonhos nas águas
quem do arpão fez seu pão
quem sofreu tamanhas mágoas
em vendavais de emoção.
REFRÃO
16. 33 VERSOS A MI MUERTE
Patxi Andión
Marinero esta tu alma teñida de mar,
calada de tiniebla y temporal.
Tienes la barca comprada y la morada alquilada,
del tal modo eres esclavo de la mar, pescador,
que el dia de la partida
y soltar la ultima amarra
no sabes dejar tu alma
en tierra adentro varada
y al final... al final es en la mar
donde la vas a entregar.
Cuando me muera no quiero
ni coronas de claveles
ni tierra con lirios viejos
que me flagelen los dedos.
Ai ai ai ai ai ai
ni tierra con lirios viejos
Ai ai ai ai ai ai
que me flagelen los dedos.
Quiero que la mar se estreche
hasta que tropiece el eco
quiero morirme despacio...
quiero morir navegando...
Ai ai ai ai ai ai
quiero morirme despacio...
Ai ai ai ai ai ai
quiero morir navegando...
Quiero darle mi alma rota
arañada en los talones
a la mas vieja gaviota...
y alimentar sus pichones.
Yo quiero sentir las olas
cubrirme toda la vida
que se me escapa sin verla
por un camino sin prisas.
Ai ai ai ai ai ai
que se me escapa sin verla
Ai ai ai ai ai ai
por un camino sin prisas.
Eu quero morrer de perto
Da cabeça até aos pés
Eu quero morrer depressa
Eu quero morrer de pé
Ai ai ai ai ai ai
Eu quero morrer depressa
Ai ai ai ai ai ai
Eu quero morrer de pé
Ai ai ai ai ai ai
Eu quero morrer de pé
Quiero darle mi alma rota
arañada en los talones
a la mas vieja gaviota
y alimentar sus pichones.
Quiero que la mar se estreche
Hasta que tropiece el eco
Quiero morirme despacio
Quiero morir navegando.
2. D. JOÃO II
Carlos Alberto Moniz/José Jorge Letria
Eu pouco me fiz ao mar
mas sou rei descobridor
mandei Naus para o oceano
para ter um mundo maior
Não foi longo o meu reinado
e se reinei com dureza
foi para pôr no seu lugar
alguns senhores da nobreza
As minhas naus alcançaram
outros mares e outras ilhas
ficou tudo no tratado
assinado em Tordesilhas
E assim ficou assente
o modo de repartir
o mundo já descoberto
e o mundo por descobrir
Se me deram o cognome
de príncipe perfeito
foi talvez por governar
trazendo à pátria proveito
A morte levou-me cedo
das andanças deste mundo
onde fiquei conhecido
por Dom João II
5. REMA PARA LÁ LANCHINHA
Carlos Alberto Moniz/Quadras tradicionais do Pico
Rema para lá, lanchinha,
Lanchinha de quatro remos!
Que amanhã é dia santo,
Temos tempo, falaremos.
Rema, que rema!
Vamos ao mar às tainhas!
No mar se apanham
Ou gradas ou miudinhas.
Rema para lá, lanchinha!
Rema bem, ó remador!
Que nessa lanchinha vai
Para longe o meu amor.
Rema, que rema!
Vamos ao mar às bicudas!
No mar se apanham
Miudinhas e graúdas.
Já fui mestre, mandei barco,
Marinheiro de abalada;
Agora que já sou velho
Só ganho meia soldada.
Rema, que rema!
Vamos ao mar à sardinha!
No mar se apanha
Muito grada e miudinha.
Quando eu era lancha nova,
Ia muita vez ao mar;
Agora que já sou velha
‘Stou posta de quilha ao ar.
Rema, que rema!
Vamos ao mar à sardinha!
No mar se apanha
Muito grada e miudinha.
Rema, que rema!
Vamos ao mar às cavalas!
No mar se apanham,
Vamos ao mar apanhá-las!
Rema, que rema!
Vamos ao mar às bicudas!
No mar se apanham
Miudinhas e graúdas.
Rema, que rema!
Vamos ao mar às tainhas!
No mar se apanham
Ou gradas ou miudinhas.
Letra e música: Tradicional (Ilha do Pico, Açores)
Recolha/transcrição: João Homem Machado (anos 30 do século XX, in “O Folclore da Ilha do Pico”, Núcleo Cultural da Horta, 1991)
Intérprete: Grupo de Cantares Belaurora* (in CD “Da Maior e da Mais Alta”, Açor/Emiliano Toste, 2010)
8. AS ILHAS DO ORIENTE
(popular da Ilha das Flores)
Mal as ilhas do Oriente
a linda manhã atingia
já ao cristalino espelho
a linda noiva se via
Alva flor de laranjeira
no véu da noiva se via
Quem se vai casar ao longe
ao perto tendo com quem
ou vai ficar enganado
ou vai enganar alguém
Alva flor de laranjeira
não a dará a ninguém
Saudades são securas
ausências são tiranias
se não usar os teus olhos
acabados são meus dias
Alva flor de laranjeira
não verás todos os dias
11. AS BORDADEIRAS
Nelson Cesário Monteiro de Barros/Fernando Carneiro de Carvalho, Maximiano de Sousa
Minha Madeira ó meu encanto
P’ra te cantar eu sou profano
Joia que Deus num dia Santo
Deixou cair no Oceano
Como Tu não há nenhuma
E nas noites sonhadores
Bordam das ondas a espuma
Os dedos das borbadoras
Minha Madeira ó meu encanto
P’ra te cantar eu sou profano
Joia que Deus num dia Santo
Deixou cair no Oceano
Como Tu não há nenhuma
E nas noites sonhadores
Bordam das ondas a espuma
Os dedos das borbadoras
Bordam das ondas a espuma
Os dedos das borbadoras
14. NAS PEDRAS NEGRAS DA ILHA
Carlos Alberto Moniz/Victor Rui Dores
Videiras do nosso espanto
Nas pedras negras da ilha
O lagar do nosso canto
Deu o fruto da partilha.
Com a casta da amizade
Fiz um tinto, deixei traço
No vinho está a verdade
E na prensa o teu abraço.
Dionísio bem-disposto
Fez do vinho liturgia
E o Baco bebe o mosto
Pelo cálice da orgia.
Venha o branco e uma carícia
O verdelho abençoado!
Pedras Brancas da delícia
Que beber não é pecado.
REFRÃO
Devagar, devagarinho
Bebo um copo de vinho
Para matar a tristeza…
E depois respiro fundo
Para devorar o mundo
Com toda a delicadeza.
Este vinho que me abrasa
É meu grãozinho na asa
Paladar consolador…
Viva a uva fermentada
A vindima fecundada
Na Fajã do nosso amor…
Devagar, devagarinho
Bebo um copo de vinho
Para matar a tristeza…
E depois respiro fundo
Para devorar o mundo
Com toda a delicadeza.
Um bom vinho de cheiro
É sempre uma boa aposta
Levedura no balseiro
Amizade em mesa posta.
No teu corpo, vinho doce,
Plantei minha flor do dia
Graciosa que me trouxe
O néctar da alegria…
REFRÃO
17. VEM TER À TERRA DOS BRAVOS
Carlos Alberto Moniz/Álamo Oliveira
vem ter à terra dos bravos
a cavalo nas marés
vem ter à terra dos bravos
com a saudade nos pés
vem ter á terra da festa
com as velhas ao teu lado
vem ter à terra da festa
namorar não é pecado
vem ter à terra dos fortes
com Samacaio à vela
vem ter à terra dos fortes
do arroz-doce e canela
vem ter à terra dos búzios
com arcadas de cigana
vem ter à terra dos búzios
ver os olhos da tirana
vem ter à terra dos bravos
com anéis de lua cheia
vem ter à terra dos bravos
com sapatos sapateia
vem ter à terra dos bravos
com sapatos sapateia
3. OH! LIBERDADE!
Carlos Alberto Moniz/Xanana Gusmão
Se eu pudesse
pelas frias manhãs
acordar tiritando
fustigado pela ventania
que me abre a cortina do céu
e ver,do cimo dos meus montes,
o quadro roxo,
de um perturbado nascer do sol
a leste de Timor
Se eu pudesse
pelos tórridos sóis
cavalgar embevecido
de encontro a mim mesmo
nas serenas planícies do capim
e sentir o cheiro de animais
bebendo das nascentes
que murmurariam no ar
lendas de Timor
Se eu pudesse
pelas tardes de calma
sentir o cansaço
da natureza sensual
espreguiçando-se no seu suor
e ouvir contar as canseiras
sob os risos
das crianças nuas e descalças
de todo o Timor
Se eu pudesse
ao entardecer das ondas
caminhar pela areia
entregue a mim mesmo
no enlevo molhado da brisa
e tocar a imensidão do mar
num sopro da alma
que permitia meditar o futuro
da ilha de Timor
Se eu pudesse
ao cantar dos grilos
falar para a lua
pelas janelas da noite
e contar-lhes romances do povo
a união inviolável dos corpos
para criar filhos
e ensinar-lhes a crescer e a amar
a Pátria Timor!
6. RECADOS DA ILHA
Carlos Alberto Moniz/Álamo Oliveira
trago as mãos com recados da ilha
com cantos do povo
e búzios com sol
do ventre, do mar
trago as mãos com os barcos vazios
com velas do povo
como um verso mole
e pomos de sal
e trago a mensagem luarenta
que diz que uma ilha
é cacho de esperança
e trago a fartura ternurenta
com calções de chita
e um bibe de criança
REFRÃO
trago a pedra lá da ilha
trago o tempo amarrado
trago a sua boca fresca
e o seu peito encarnado
trago a paz das suas veias
suas calças de vestir
toda a alma do meu povo
com recados a florir
trago as mãos com os milhos da ilha
a voz da semente a terra a saltar
na boca do frio
trago as mãos tão inchadas de espanto
porque a minha gente
sabe ainda dar
as mãos a sorrir
REFRÃO
9. SAUDADE + SODADE
Popular Açoriana/Amândio Cabral
SAUDADE
são tantas as saudades
que as nem posso contar
são tantas como as estrelas
como as areias do mar
A palavra saudade
Aquele que a inventou
A primeira vez que a disse
Com certeza que chorou
SODADE
Sodade, sodade
Sodade dessa minha terra, São Nicolau
Sodade, sodade
Sodade dessa minha terra, CaboVerde
Quem mostrava esse caminho longe?
Esse caminho pa São Tomé
Sodade, sodade
Sodade dessa minha terra, São Nicolau
Sodade, sodade
Sodade dessa minha terra, CaboVerde
Se vou escrever muito a escrever
Se vou esquecer muito a esquecer
Até dia que vou voltar
Sodade, sodade
Sodade dessa minha terra, São Nicolau
Sodade, sodade
Sodade dessa minha terra, CaboVerde
12. AÇORES
Carlos Alberto Moniz/Sophia de Melo Breyner Andresen
Há um intenso orgulho
Na palavra Açor
E em redor das ilhas
O mar é maior
Como num convés
Respiro amplidão
No ar brilha a luz
Da navegação
Mas este convés
É de terra escura
É de lés a lés
Prado agricultura
É terra lavrada
Por navegadores
E os que no mar pescam
São agricultores
Por isso há nos homens
Aprumo de proa
E não sei que sonho
Em cada pessoa
As casas são brancas
Em luz de pintor
Quem pintou as barras
Afinou a cor
Aqui o antigo
Tem o limpo do novo
É o mar que traz
Do largo o renovo
É como num convés
De intensa limpeza
Há no ar um brilho
De bruma e clareza
É convés lavrado
Em plena amplidão
É o mar que traz
As ilhas na mão
Buscámos no mundo
Mar e maravilhas
Deslumbradamente
Surgiram nove ilhas
E foi na Terceira
Com o mar à proa
Que nasceu a mãe
Do poeta Pessoa
Em cujo poema
Respiro amplidão
E me cerca a luz
Da navegação
Em cujo poema
Como num convés
A limpeza extrema
Luz de lés a lés
Poema onde está
A palavra pura
De um povo cindido
Por tanta aventura
Poema onde está
A palavra extrema
Que une e reconhece
Pois só no poema
Um povo amanhece.
15. FUI À BEIRA DO MAR
José Afonso
Fui à beira do mar
Ver o que lá havia
Fui à beira do mar
Ver o que lá havia
Ouvi uma voz cantar
Que ao longe me dizia
Oh cantador alegre
Que é da tua alegria
Oh cantador alegre
Que é da tua alegria
Tens tanto para andar
E a noite está tão fria
Tens tanto para andar
E a noite está tão fria
Desde então a lavrar
No meu peito a Alegria
Desde então a lavrar
No meu peito a Alegria
Ouço alguém a bradar
Aproveita que é dia
Sentei-me a descansar
Enquanto amanhecia
Sentei-me a descansar
Enquanto amanhecia
Entre o céu e o mar
Uma proa rompia
Entre o céu e o mar
Uma proa rompia
Desde então a bater
No meu peito em segredo
Desde então a bater
No meu peito em segredo
Sinto uma voz dizer
Teima, teima sem medo
Desde então a lavrar
No meu peito a Alegria
Desde então a lavrar
No meu peito a Alegria
Ouço alguém a bradar
Aproveita que é dia
Ouço alguém a bradar
Aproveita que é dia